terça-feira, 24 de dezembro de 2013

O perfume



Dia 24 de dezembro, 11h.

Daqui a 5 horas as lojas vão fechar, apesar da insistência de alguns clientes que ficarão lá dentro ainda tentando escolher algum presente. Eles vão implorar por “mais um minutinho”  enquanto os vendedores trocam de roupa correndo, para pegar o ônibus e chegar em casa a tempo da ceia.

Alheio ao desespero das inacreditáveis "compras de última hora", um senhor toma um café em um balcão segurando apenas uma diminuta sacola da loja de perfumes caros. Nela está o frasco de perfume francês com que presenteia sua mulher há anos. Dezenas de anos. 

É o único presente que ele compra. De todos os outros, ela se ocupa.  Assim como se ocupa dos presentes de aniversário, das gentilezas com os amigos, de fazer enxoval quando nasce um neto ou de mandar corbeilles aos enterros. A roupa bem passada, a calça com a bainha feita, as meias com elásticos em dia... De tudo ela cuida. Os óculos que ele usa têm lentes novas porque ela mandou trocar. De tudo mesmo... ela cuida.

Ele vai entregar o presente mais tarde e, posso apostar, vai beijá-la na testa. Talvez, depois de algumas taças de vinho, lhe dê um selinho quando os netos gritarem “beija, beija, beija”.

“É um casamento de outra época”, você vai me dizer. Será que isso explica tudo?

Para alguém esse homem guardou suas emoções; suas alegrias, medos, tristezas, sua raiva... seu amor. Dele, tudo o que a mulher ganhou foi perfume de francês no Natal, rosas vermelhas no aniversário e bombom de cereja da Kopenhagen na Páscoa. Talvez ela não precisasse de presente algum, ou que ele se preocupasse com qualquer data, se ele tivesse algo além de formalidades para lhe oferecer.

Se você perguntar à essa mulher hoje se é feliz assim, ela garantirá que sim. Vai apontar para a mesa farta, a família unida, para os netos lindos... Mas é mentira.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Carregue menos peso; encare suas escolhas



- Epi... o que, doutor?
- Epicondilite medial. Também conhecido como "cotovelo de golfista"
- Pelo jeito quem não joga golf também sofre dessa inflamação no cotovelo, né?
- Sim. Uso de mouse, uso celulares com função touch... Também podem causar a lesão. Você joga Candy Crush?
- Não, doutor. Desse vício escapei. Estou limpa desde que joguei todas as fases do Angry Birds.
- Tenho atendido muita gente  do Candy Crush...
- Sei...
- Outro fator que costuma agravar essa inflamação é bolsa pesada. Posso segurar a  sua?
- Claro
(Pausa dramática)
(Cara de choque)
- O tratamento é gelo, anti-inflamatório e deixar em casa metade do que você carrega na bolsa.

Na porta do consultório, a espera do elevador, eu já estava pensando o que ficaria de fora da bolsa; minha casa portátil. Não gosto de ser pega desprevenida por isso sempre andei munida do que se pode precisar a qualquer momento: lenço descartável, álcool gel, pasta e escova de dentes, caneta que tira manchas, alfinete de segurança, farmacinha básica, filtro solar, grampos, fio dental, caderneta de anotações, caneta, pen-drive, creme para as mãos, maquiagem... Além de carteira, óculos escuros, celular pessoal, celular funcional, carregador de celular, carteira de documentos do carro, chaves e crachá da empresa.

De qual desses itens você poderia abrir mão? Individualmente, nada disso pesa. Mas o kit "pronta pra tudo" é puxado; em vários sentidos.

Por onde começo então? Que diferença faz tirar 4 band-aids da bolsa?! É preciso começar mesmo por coisas que pareçam insignificantes.

A caixa dos óculos escuros foi substituída por uma bolsinha de pano, o carregador de celular saiu, já que tenho um em casa, outro no trabalho e um terceiro, no carro. Caderneta de anotações saiu porque tenho a opção de tomar notas no celular. Álcool gel saiu, mas depois voltou. O filtro solar se multiplicou e agora também tenho 3 também: casa, trabalho e carro. Pasta e escova de dentes ficaram em definitivo no trabalho, onde costumo almoçar. E a necessaire foi divida em duas: maquiagem e remédios. Mas não funcionou.

Tira tudo, espalha em cima da mesa e escolhe. Quem precisa de 3 batons? Remédio para alergia eu só uso uma vez ano...

Cheguei a uma necessaire menor, com maquiagem básica, lixa de unha, band-aids, álcool gel e remédio para dor de cabeça. Se arrumá-la bem direitinho, talvez caiba o creme para as mãos... 

Vamos ver como fica. Só existe um jeito de carregar menos peso: encarando suas escolhas.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Porque hoje senti saudade de mim




Queen em Montreal

Esse é considerado o maior show da carreira do “Queen” (link acima). Aconteceu em 24 de novembro de 1981 em Montreal, no Canadá. Exatamente nessa data, dez anos depois, Fred Mercury morreu. Quem diria que seria tão rápido? E quem diria que uma dia eu sentiria tanta saudade de algo que não vivi?

Tinha 10 anos nessa noite e Montreal fica a mais de 8 mil quilômetros da minha casa. Dessa época, minha memória musical guarda um pop-brega-nacional que tocava nas rádios e no programa do Chacrinha. Não prestei atenção nesse homem que desfilava no palco como um Super Homem pós-moderno muito antes da modernidade acontecer.

O Queen já chegou pra mim em CD.  Então sou uma fã meio constrangida; não sou “raiz”, não “conheci antes de todo mundo”, não... sei lá. Aprendi as músicas quando ninguém mais falava deles e quando – infelizmente – não haveria mais chance de vê-los tocando.

Amo tudo nessas imagens. O improviso do início, a música, a letra, a calça branca justinha quando todos os roqueiros se apresentavam de preto, a voz, os copos de cerveja, o balé com o microfone e os punhos cerrados no fim.

Não me atualizei musicalmente. Algumas coisas me agradam de ouvido, mas não sei os nomes, não acompanho, não compro CD, não baixo música, não vou a show. Pena. Falta de tempo? De interesse? Não dá para estar por dentro de tudo. Terei oportunidade de rever isso a medida que meu filho for crescendo.

Ele me apresentou à Galinha Pintadinha e eu retribui com o Queen. 

“Então isso é o Rock n´Roll, mãe?” 

Respondi que sim. E ele me pediu para tocar de novo. Vai chegar o momento em que ele me surpreenderá com alguma novidade, mas, por enquanto, me divirto no século passado.

Jovens senhores e jovens senhores, meet the Queen.

Esse será o som da minha noite. Porque, como diz minha amiga Cristiana Sousa Cruz, hoje senti muita saudade de mim.

domingo, 26 de maio de 2013

O perfume e a evasão de privacidade



Já troquei de lugar em restaurante para não ter que aguentar o perfume da cidadã da mesa ao lado. Já troquei de lugar no ônibus, já saí de um consultório médico abandonando o tratamento porque a médica usava perfume forte!

Muitas mulheres (tenho a impressão de que é mais frequente com as mulheres) não entendem que você usa perfume para você e para as pessoas com quem você tem intimidade: amigos que vão te abraçar e beijar e o namorado que vai cafungar o seu cangote.

Se eu, que estou a mais de 60 cm de distancia sinto o seu perfume, isso é um ataque, uma agressão, um exagero. Eu posso não gostar de perfume (gosto de poucos), eu posso estar com dor de cabeça, eu posso simplesmente não querer essa informação.

Quem leu "O Perfume", do Patrick Süskind? "...as pessoas podiam fechar os olhos diante da grandeza, do assustador, da beleza, e podiam tapar os ouvidos diante da melodia ou de palavras sedutoras... Mas não podiam escapar ao aroma. Pois o aroma é um irmão da respiração".

sábado, 9 de março de 2013

A origem dos ovos de Páscoa






Uma paixão que não mudou com a idade foi pelo chocolate. Meu gosto sim; se adaptou a um chocolate mais amargo - melhor para a saúde e mais "recheado" de informação. Mas continuo fascinada pelo colorido da Páscoa e, numa pesquisa que virou livro, descobri a origem deste costume. 

A Páscoa é o Natal dos chocolates. É quando a indústria mais vende, os fabricantes lançam suas novidades e fazem suas apostas. Existem pequenas fábricas brasileiras em que as vendas na Páscoa representam 80% do faturamento anual.

Em muitas culturas antigas, ocidentais e orientais, o ovo era um presente comum, em geral, distribuído em festas pagãs que marcavam o início da primavera, que no hemisfério norte começa em março.  Nas mitologias anglo-saxã e germânica, a deusa da primavera e do renascimento chama-se Ostera (“Páscoa”, em inglês, é Easter, e, em alemão, Ostern).

Em tais festas pagãs, os ovos eram pintados com motivos que faziam alusão à natureza, como flores, frutos e animais.  Em algum momento, esses ovos passaram a ser esvaziados e preenchidos com confeitos.

Entre os séculos XVII e XIX, os nobres europeus presenteavam amigos e parentes com ovos feitos de metais nobres e incrustados com pedras preciosas. Um grande artista dessa Páscoa requintada foi o joalheiro russo Peter Carl Fabergé (1846-1920), que ganhou celebridade após receber encomendas dos czares da Rússia.

Porém, retornando ao mundo plebeu, o ovo de chocolate, de acordo com uma das versões mais correntes, foi uma invenção inglesa – embora a França dispute essa honra –surgindo assim que a tecnologia de fabricação permitiu que se moldasse o chocolate. Os ovos de Páscoa, que eram preenchidos com doces, passaram a ser inteiramente comestíveis.

Essa e outras histórias sobre o chocolate estão no livro "Chocolate, por que gostamos tanto?", meu e do André Modenesi.
Clique para comprar o livro


quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Um livro; duas histórias




 "A Árvore Generosa", de Shel Silverstein, traduzido no Brasil pelo Fernando Sabino, foi o primeiro livro que li sozinha; assim que fui alfabetizada. Guardo a edição que ganhei em 1977 com dedicatória da professora Vera Lúcia Alves: "eu sempre quis te ensinar mais do que palavras"... (suspiros)

Esse livro sempre me fez pensar sobre entrega e sobre limites. Em alguns momentos da vida somos meninos que tudo querem e em outros, árvores que entregam tudo o que têm a meninos gulosos, mesmo que em prejuízo próprio.

O livro foi reeditado há poucos anos. E comprei um novo exemplar bem animada para ler para minha sobrinha. Ela não gostou. "Tia, porque a árvore deu tudo para o menino e não ficou com nada para ela!? Tá errado isso. E ele não pensou nela? E ele cortou a árvore?", se indignou.

Outros anos se passaram e esta semana li o livro para meu filho, 4 anos. A reação também não foi boa. "Mãe, esse livro é triste e cortar árvore é ruim para o planeta. Não quero mais ler essa história", resolveu.

A leitura é outra. Do mesmo livro, das mesmas palavras, ilustradas com os mesmos desenhos, mas num mundo muito diferente.

Tia Vera me ensinou mais do que palavras. Me deu suas maças, seus galhos em que me balancei e seu tronco que virou barco para que eu pudesse navegar. E agora aprendo o que não se ensinava a uma menina em 1977: não cortar árvores e estabelecer limites menos elásticos.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Sonhar não custa nada


Meu filho acorda me contando uma história confusa e fantástica.

- Filho, você sonhou.
(pausa dramática)
- Sonho é quando a gente vê as coisas de olho fechado?
- Isso, filho, podemos dizer que sim.
- E por que quando a gente abre o olho o sonho some?
- Porque o sonho estava só na sua cabeça, enquanto você dormia. Quando você acorda, abre os olhos e vê o que está acontecendo de verdade.


Ele sorriu um pouco confuso, deu o assunto por encerrado e saiu arrastando sua cara gostosa de sono.

Eu queria ter continuado. Queria dizer a ele que o sonho é nossa válvula de escape; de coisas boas, de coisas ruins, proibidas... De medos, de fantasias... É uma forma de viver isso tudo sem censura, sem filtro. Sonho a gente não escolhe. Nossa cabeça sai para passear enquanto nosso corpo está entregue ao sono. E aí vem um filme de roteiro louco, embaralhando nossos desejos mais fortes com tudo o que escondemos durante o dia.

Os sonhos nos ajudam a organizar os pensamentos, nos denunciam, nos contam, nos revelam, nos fazem pensar, nos angustiam, nos divertem, nos fazem criar! Gostaria que ele refletisse sobre o privilégio que é sonhar. E nos lembrarmos do que sonhamos depois que acordamos.

Queria falar para ele de Freud, de José no Egito interpretando os sonhos do faraó, contar que os esotéricos acreditam que nossa alma vai a outros lugares enquanto dormimos, queria cantar o samba enredo na Mocidade Independente de Padre Miguel de 1992... "Sonhar não custa nada. O meu sonho é tão real. Mergulhei nessa magia. Era tudo que eu queria para esse carnaval..."

Mas ele se foi... de pijama, descabelado, assistir ao desenho animado na televisão. E deixou minha ansiedade de mãe aqui nesse post. Obrigada, meu blog, por ter poupado meu filho desse surto materno.